CAPÍTULO XIV. NÃO POR A CANDEIA
DEBAIXO DO ALQUEIRE.
PORQUE FALA JESUS POR
PARÁBOLAS.
São Mateus
no capítulo V, versículo 15, recorda as palavras de Jesus falando por
parábolas: Nem os que acendem uma luzerna a
metem debaixo do alqueire, mas põem-na sobre o candeeiro, a fim de que ela dê
luz a todos os que estão na casa.
E São Lucas
no capítulo VIII, versículos 16 e 17 também lembra as palavras por parábolas de
Jesus: Ninguém, pois, acende uma luzerna e a
cobre com alguma vasilha, ou a põe debaixo da cama; põe-na, sim, sobre um
candeeiro, para que vejam a luz os que entram. Porque não há coisa encoberta,
que não haja de ser manifestada; nem escondida, que não haja de saber-se e
fazer-se pública.
E no capítulo XIII, versículos 10 e
15, São Mateus conta também, que se chegando a Jesus os discípulos lhe
disseram: Por que razão lhes fala tu por parábola? Ele, respondendo, lhes
disse: Porque a vós outro vos é dado saber os mistérios do Reino dos Céus, mas
a eles não lhes é concedido. Porque ao que tem, se lhe dará, e terá em
abundância; mas ao que não tem até o que tem lhe será tirado. Por isso é que eu
lhes falo em parábolas; porque eles vendo, não veem, e ouvindo não ouvem, nem
entendem. De sorte que neles se cumpre a profecia de Isaías, que diz: Vós
ouvireis com os ouvidos, e não escutareis; e olhareis com os olhos, e não
vereis. Porque o coração deste povo se fez pesado, e os seus ouvidos se fizeram
tardos, e eles fecharam os seus olhos; para não suceder que vejam com os olhos,
e ouçam com os ouvidos, e entendam no coração, e se convertam, e eu os sare.
Pois é,
procurando entender o significado das palavras de Jesus, chega-se a conclusão,
que acaba causando estranheza ouvir Jesus dizer
que não se deve por a luz debaixo do alqueire, ao mesmo tempo em que esconde a
toda hora o sentido das suas palavras sob o véu da alegoria, que nem todos
podem compreender. Ele se explica, entretanto, dizendo aos apóstolos: Eu
lhes falo em parábolas, porque eles não estão em condições de compreender
certas coisas; eles veem, olham, ouvem e não compreendem; assim, dizer-lhes
tudo, ao menos agora seria inútil; mas a vós o digo, porque já vos é dado
compreender esses mistérios. Ele procedia, portanto, para com o povo,
como se faz com as crianças, cujas ideias ainda não se encontram desenvolvidas.
Dessa maneira, indica-nos o verdadeiro sentido da máxima: “Não se deve por a
candeia debaixo do alqueire, mas sobre o candeeiro, a fim de que todos os que
entram possam vê-la”. Ela não diz que tenhamos de revelar inconsideravelmente
todas às coisas, pois, todo ensinamento deve ser proporcional à inteligência de
quem o recebe, e porque há pessoas que uma luz muito viva pode ofuscar sem
esclarecer.
Acontece com os homens em geral, o
mesmo que com os indivíduos. As gerações passam também pela infância, pela
juventude e pela madureza. Cada coisa deve vir a seu tempo, pois a sementeira
lançada a terra, fora de tempo, não produz. Mas aquilo que a prudência manda
calar momentaneamente, cedo ou tarde deve ser descoberto, porque chegando a
certo grau de desenvolvimento, os homens procuram por si mesmos a luz viva; a
obscuridade lhes pesa. Como Deus lhes deu a inteligência para compreenderem e
se guiarem, entre as coisas da Terra e do céu, eles querem racionalizar a sua
fé. É então que não se deve por a candeia debaixo do alqueire, pois sem
a luz da razão, a fé se enfraquece.
E se a Providência, portanto, na sua prudente sabedoria,
não revela a verdade senão gradualmente, é que a vai sempre desvelando, à
medida que a Humanidade amadurece para recebê-la. Ela mantém a luz em reserva,
e não debaixo do alqueire. Mas os homens que a possuem, em geral, só a ocultam
do vulgo com a intenção de dominá-lo. São esses os que põem verdadeiramente a
luz debaixo do alqueire. É assim que todas as religiões sempre tiveram os seus
mistérios, cujo exame proíbem. Mas enquanto essas religiões se atrasavam, a
ciência e a inteligência avançaram e romperam o véu misterioso. O povo que se
tornou adulto pode assim penetrar o fundo das coisas, e então rejeitou na sua
fé o que se mostrava contrário à observação.
Não podem substituir mistérios absolutos
nesse terreno, e Jesus está com a razão quando afirma que não há nada secreto
que não deva ser conhecido. Tudo o que está oculto será descoberto um dia, e o
que o homem ainda não pode compreender sobre a Terra, lhe será progressivamente
revelado nos mundos mais adiantados, na proporção em que ele se purificar. Aqui
na Terra, ainda se perde no nevoeiro.
Pergunta-se que proveito o povo
poderia tirar dessa infinidade de parábolas, cujo sentido estava oculto para
ele. Deve notar-se que Jesus só se exprimiu em parábolas sobre as questões, de
alguma maneira abstrata, da sua doutrina. Mas, tendo feito da caridade e da
humildade a condição expressa da salvação, tudo o que disse a esse respeito é
perfeitamente claro, explícito e sem nenhuma ambiguidade. Assim, devia ser,
porque se tratava de regra de conduta, regra que todos deviam compreender, para
poderem observar. Era isso o essencial para a multidão ignorante, à qual se
limitava a dizer: Eis o que é necessário para se ganhar o Reino dos Céus. Sobre
outras questões, só desenvolvia os seus pensamentos para os discípulos. Estando
eles mais adiantados, moral e intelectualmente, Jesus podia iniciá-los nos
princípios mais abstratos. Foi por isso que disse: Ao que já tem ainda
mais se dará, e terá em abundância.
Não obstante, mesmo com os apóstolos,
tratou de modo vago sobre muitos pontos, cuja inteligência completa estava
reservada aos tempos futuros. Foram esses os pontos que deram lugar a diversas
interpretações, até que a Ciência, de um lado, e o Espiritismo, de outro,
vieram revelar as novas leis da natureza, que tornaram compreensível o seu
verdadeiro sentido.
O Espiritismo vem atualmente lançar a
sua luz sobre uma porção de pontos obscuros, mas não o faz inconsideravelmente.
Os Espíritos procedem, nas suas instruções, com admirável prudência. É
sucessiva e gradualmente que eles têm abordado as diversas partes já conhecidas
da doutrina, e é assim que as demais partes serão reveladas no futuro, à medida
que chegue o momento de fazê-las sair da obscuridade. Se a houvessem
apresentado completa desde o início, ela não teria sido acessível senão a um
pequeno número e teria mesmo assustado aqueles que não se achavam preparados, o
que seria prejudicial à sua propagação. Se os Espíritos, portanto, ainda não
dizem tudo ostensivamente, não é porque a doutrina possua mistérios reservados
aos privilegiados, nem que eles ponham a candeia debaixo do alqueire,
mas por que cada coisa deve vir no tempo oportuno. Eles dão a cada ideia
o tempo de amadurecer e se propagar, antes de apresentarem outra, e aos
acontecimentos, o tempo de lhes preparar a aceitação.
Bibliografia: O Evangelho Segundo o
Espiritismo. Mensagem lida e divulgada pelo Médium Getulio Pacheco Quadrado.