terça-feira, 30 de agosto de 2016

LIVRO DOS ESPÍRITOS. CAPÍTULO II.
A prece
A prece é sempre agradável a Deus quando dita pelo coração, porque a intenção é tudo para Ele. A prece do coração é preferível, do que à que podemos ler por mais bela que seja, se a lermos mais com os lábios e não o com o pensamento. A prece é agradável a Deus quando é proferida com fé, com fervor e sinceridade. Não creiamos, pois, que Deus seja tocado pelo ser humano em vão, orgulhoso e egoísta, a menos que a prece represente um ato de sincero arrependimento e de verdadeira humildade.
O caráter geral da prece vem a ser um ato de adoração. Fazer preces a Deus é pensar Nele, aproximar-se Dele, pôr-se em comunicação com Ele. Pela prece podemos fazer três coisas: louvar, pedir e agradecer.
A prece torna o ser humano melhor porque aquele, que faz preces com fervor e confiança se torna mais forte contra as tentações do mal, e Deus lhe envia Bons Espíritos para o assistir. É um socorro jamais recusado, quando o pedimos com sinceridade.
A explicação é de que certas pessoas que oram muito, sejam apesar disso de muito mau caráter, ciumentas, invejosas, implicantes, faltas de benevolência e de indulgência; que sejam até mesmo viciosas, explica-se assim:
O essencial não é orar muito, mas orar bem. Essas pessoas julgam que todo o mérito está na extensão da prece, e fecham os olhos para os seus próprios defeitos. A prece é para elas uma ocupação, um emprego do tempo, mas não um estudo de si mesmas. Não é o remédio que é ineficaz neste caso, mas a maneira de aplicá-lo.
Pode-se pedir eficazmente a Deus o perdão das faltas, porque Deus sabe discernir o bem e o mal; a prece não oculta as faltas. Aquele que pede a Deus o perdão de suas faltas não obtém se não mudar de conduta. As boas ações são a melhor prece, porque os atos valem mais do que as palavras.
Pode-se orar utilmente pelos outros, pois o Espírito daquele que ora está agindo pela vontade de fazer o bem. Pela prece atrai a ele os bons Espíritos que se associam ao bem que deseja fazer.
Comentário de Kardec: Possuímos em nós mesmos pelo pensamento e a vontade, um poder de ação que se estende muito além dos limites de nossa esfera corpórea. A prece por outros é um ato dessa vontade. Se for ardente e sincera, pode chamar os bons Espíritos em auxílio daquele por quem pedimos, a fim de lhe sugerirem bons pensamentos e lhe darem a força necessária para o corpo e a alma. Mas ainda nesse caso a prece do coração é tudo e a dos lábios não é nada.
As preces que fazemos por nós mesmos podem modificar a natureza das nossas provas e desviar o curso, porque as nossas provas estão nas mãos de Deus e lida as que devem ser suportadas até o fim. Mas Deus leva sempre em conta a resignação. A prece atrai a nós os bons Espíritos que nos dão a força de as suportar com coragem. Então elas nos parecem menos duras. Já o dissemos: a prece nunca é inútil, quando bem feita, porque dá força, o que já é um grande resultado. Ajuda-te a ti mesmo e o céu te ajudará; sabemos disso. Aliás, Deus não pode mudar a ordem da Natureza ao sabor de cada um, porque aquilo que é um grande mal do nosso ponto de vista mesquinho, para nossa vida efêmera, muitas vezes é um grande bem na ordem geral do Universo. Além. Disso: de quantos males o ser humano é o próprio autor por sua imprevidência ou por suas faltas. Ele é punido no que pecou. Não obstante, os nossos justos pedidos são em geral mais escutados do que julgamos. As vezes pensamos que Deus não vos ouviu porque não fez um milagre em nosso favor, quando, entretanto, nos assiste por meios tão naturais que nos parecem o efeito do acaso ou da força das circunstâncias. Frequentemente, ou o mais frequentemente, ele nos suscita o pensamento necessário para sairmos por nós mesmos do embaraço.
É útil sim orarmos pelos mortos e pelos Espíritos sofredores. Com ela pode nesse caso lhes proporcionar consolo e abreviar os sofrimentos.
A prece não pode ter o efeito de mudar os desígnios de Deus, mas a alma pela qual se ora experimenta alívio, porque é um testemunho de interesse que se lhe dá e porque o infeliz, é sempre consolado, quando encontra almas caridosas que compartilham as suas dores. De outro lado, pela prece provoca-se o arrependimento, desperta-se o desejo de fazer o necessário para se tornar feliz.  É nesse sentido que se pode abreviar a sua pena se do seu lado ele contribui com a sua boa vontade. Esse desejo de melhora, excitado pela prece, atrai para o Espírito sofredor os Espíritos melhores que vêm esclarecê-lo, consolá-lo e dar-lhe esperanças. Jesus orava pelas ovelhas transviadas. Com isso nos mostra que seremos culpados se nada fizermos pelos que mais necessitados.
Mesmo não estando prescrita no Evangelho, a prece pelos mortos, temos que pensar da seguinte forma:
O Cristo disse aos seres humanos: amai-vos uns aos outros. Essa recomendação implica a de empregar todos os meios possíveis de testemunhar afeição aos outros, sem entrar, por isso mesmo, em nenhum detalhe sobre a maneira de atingir o objetivo. Se é verdade que nada pode desviar o Criador de aplicar a justiça inerente a Ele mesmo, a todas as ações do Espírito, não é menos verdade que a prece que lhe dirigis em favor daquele que vos inspira afeição, é para este um testemunho de recordação que não pode deixar de contribuir para aliviar os seus sofrimentos e o consolar. Desde que ele revele o mais leve arrependimento, e somente então, será socorrido; mas isso não o deixará jamais esquecer que uma alma simpática se ocupou dele, e lhe dará a doce crença de que a sua intercessão lhe foi útil. Disso resulta necessariamente de sua parte, um sentimento de afeição por aquele que lhe deu essa prova de interesse e de piedade. Por conseguinte, o amor recomendado aos seres humanos pelo Cristo não fez mais do que aumentar entre eles, e ambos obedeceram à lei de amor e de união de todos os seres.
Podemos orar aos bons Espíritos como sendo os mensageiros de Deus e os executores de seus desígnios, mas o seu poder está na razão da sua superioridade e decorre sempre do Senhor de todas as coisas, sem cuja permissão nada se faz; porque as preces que lhes dirigimos só são eficazes se forem agradáveis a Deus.
Bibliografia: O Livro dos Espíritos.





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