LIVRO
DOS ESPÍRITOS. CAPÍTULO II.
A
prece
A prece é sempre agradável a Deus quando dita pelo
coração, porque a intenção é tudo para Ele. A prece do coração é
preferível, do que à que podemos ler por mais bela que seja, se a lermos
mais com os lábios e não o com o pensamento. A prece é agradável a Deus
quando é proferida com fé, com fervor e sinceridade. Não creiamos, pois,
que Deus seja tocado pelo ser humano em vão, orgulhoso e egoísta, a menos
que a prece represente um ato de sincero arrependimento e de verdadeira
humildade.
O caráter geral da prece
vem a ser
um ato de adoração. Fazer preces a Deus é pensar Nele, aproximar-se Dele,
pôr-se em comunicação com Ele. Pela prece podemos fazer três coisas:
louvar, pedir e agradecer.
A prece torna o ser humano
melhor porque aquele, que
faz preces com fervor e confiança se torna mais forte contra as tentações
do mal, e Deus lhe envia Bons Espíritos para o assistir. É um socorro
jamais recusado, quando o pedimos com sinceridade.
A explicação é de que
certas pessoas que oram muito, sejam apesar disso de muito mau caráter,
ciumentas, invejosas, implicantes, faltas de benevolência e de indulgência; que
sejam até mesmo viciosas, explica-se assim:
O essencial não é orar muito, mas orar bem. Essas
pessoas julgam que todo o mérito está na extensão da prece, e fecham os
olhos para os seus próprios defeitos. A prece é para elas uma ocupação, um
emprego do tempo, mas não um estudo de si mesmas. Não é o
remédio que é ineficaz neste caso, mas a maneira de aplicá-lo.
Pode-se pedir eficazmente
a Deus o perdão das faltas, porque Deus sabe discernir o bem e o mal; a prece não
oculta as faltas. Aquele que pede a Deus o perdão de suas faltas não obtém
se não mudar de conduta. As boas ações são a melhor prece, porque os atos
valem mais do que as palavras.
Pode-se orar utilmente
pelos outros, pois
o Espírito daquele que ora está agindo pela vontade de fazer o bem. Pela
prece atrai a ele os bons Espíritos que se associam ao bem que deseja fazer.
Comentário
de Kardec: Possuímos
em nós mesmos pelo pensamento e a vontade, um poder de ação que se estende
muito além dos limites de nossa esfera corpórea. A prece por outros é um ato
dessa vontade. Se for ardente e sincera, pode chamar os bons Espíritos em
auxílio daquele por quem pedimos, a fim de lhe sugerirem bons pensamentos e lhe
darem a força necessária para o corpo e a alma. Mas ainda nesse caso a prece do
coração é tudo e a dos lábios não é nada.
As preces que fazemos por
nós mesmos podem modificar a natureza das nossas provas e desviar o curso,
porque as nossas
provas estão nas mãos de Deus e lida as que devem ser suportadas até o
fim. Mas Deus leva sempre em conta a resignação. A prece atrai a nós os
bons Espíritos que nos dão a força de as suportar com coragem. Então elas
nos parecem menos duras. Já o dissemos: a prece nunca é inútil, quando bem
feita, porque dá força, o que já é um grande resultado. Ajuda-te a ti
mesmo e o céu te ajudará; sabemos disso. Aliás, Deus não pode mudar
a ordem da Natureza ao sabor de cada um, porque aquilo que é um grande
mal do nosso ponto de vista mesquinho, para nossa vida efêmera, muitas
vezes é um grande bem na ordem geral do Universo. Além. Disso: de quantos
males o ser humano é o próprio autor por sua imprevidência ou por suas faltas.
Ele é punido no que pecou. Não obstante, os nossos justos pedidos são em
geral mais escutados do que julgamos. As vezes pensamos que Deus não vos
ouviu porque não fez um milagre em nosso favor, quando, entretanto, nos
assiste por meios tão naturais que nos parecem o efeito do acaso ou da
força das circunstâncias. Frequentemente, ou o mais frequentemente, ele nos
suscita o pensamento necessário para sairmos por nós mesmos do embaraço.
É útil sim orarmos pelos
mortos e pelos Espíritos sofredores. Com ela pode nesse caso lhes proporcionar
consolo e abreviar os sofrimentos.
A prece não pode ter o efeito de mudar os desígnios
de Deus, mas a alma pela qual se ora experimenta alívio, porque é um
testemunho de interesse que se lhe dá e porque o infeliz, é sempre
consolado, quando encontra almas caridosas que compartilham as suas dores.
De outro lado, pela prece provoca-se o arrependimento, desperta-se o desejo de
fazer o necessário para se tornar feliz. É nesse sentido que se
pode abreviar a sua pena se do seu lado ele contribui com a sua boa
vontade. Esse desejo de melhora, excitado pela prece, atrai para o
Espírito sofredor os Espíritos melhores que vêm esclarecê-lo, consolá-lo e
dar-lhe esperanças. Jesus orava pelas ovelhas transviadas. Com isso nos
mostra que seremos culpados se nada fizermos pelos que mais necessitados.
Mesmo não estando
prescrita no Evangelho, a prece pelos mortos, temos que pensar da seguinte
forma:
O Cristo disse aos seres humanos: amai-vos uns
aos outros. Essa recomendação implica a de empregar todos os meios
possíveis de testemunhar afeição aos outros, sem entrar, por isso mesmo,
em nenhum detalhe sobre a maneira de atingir o objetivo. Se é verdade que
nada pode desviar o Criador de aplicar a justiça inerente a Ele mesmo, a
todas as ações do Espírito, não é menos verdade que a prece que lhe
dirigis em favor daquele que vos inspira afeição, é para este um
testemunho de recordação que não pode deixar de contribuir para aliviar os
seus sofrimentos e o consolar. Desde que ele revele o mais leve
arrependimento, e somente então, será socorrido; mas isso não
o deixará jamais esquecer que uma alma simpática se ocupou dele, e lhe
dará a doce crença de que a sua intercessão lhe foi útil. Disso resulta
necessariamente de sua parte, um sentimento de afeição por aquele que lhe
deu essa prova de interesse e de piedade. Por conseguinte, o amor
recomendado aos seres humanos pelo Cristo não fez mais do que aumentar entre
eles, e ambos obedeceram à lei de amor e de união de todos os seres.
Podemos orar aos bons Espíritos como sendo os
mensageiros de Deus e os executores de seus desígnios, mas o seu poder
está na razão da sua superioridade e decorre sempre do Senhor
de todas as coisas, sem cuja permissão nada se faz; porque as preces que
lhes dirigimos só são eficazes se forem agradáveis a Deus.
Bibliografia:
O Livro dos Espíritos.
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