Letargia,
catalepsia, mortes aparentes
A
catalepsia e a letargia foram classificadas por Kardec como faculdades de
emancipação ou desdobramento da alma. Geralmente, durante o surto, os
letárgicos e os catalépticos ficam imobilizados, vendo e ouvindo o que acontece
ao redor, sem poder se exprimir, o que lhes dá uma sensação de impotência e
muito desconforto, isto é, guardam, em espírito, consciência de si, mas não
podem comunicar-se.
Em
nota à questão 424 de O Livro dos
Espíritos, Kardec estabelece a diferença entre uma e outra, explicando que,
embora repousem sobre o mesmo princípio (perda temporária da sensibilidade e do
movimento), a letargia é um estado bem mais agudo, porque a suspensão das forças vitais é geral e
dá ao corpo todas as aparências da morte, ao contrário da catalepsia, na qual a
paralisação é localizada, podendo atingir uma parte mais ou menos
extensa do corpo físico, mas permitindo que a inteligência se manifeste
livremente. E conclui: “A letargia é
sempre natural; a catalepsia é, por vezes, magnética”.[i]
Alguns
neurocientistas e psiquiatras, despreocupados com a questão do Espírito e com
as gradações do fenômeno, designam-no simplesmente de catalepsia, associando-o
aos “distúrbios do sono”. Sem determinar, com segurança, a causa de tais
distúrbios, especulam que eles podem ter origem em traumatismos cranianos ou em
manifestações de esquizofrenias ou histerias, neste último caso relacionadas a
choques emocionais.[ii]
Nas
formas menos agudas, a catalepsia acomete, com relativa frequência, muitas
pessoas, durante a noite, embora nem sempre seja notada por aquele que dorme,
evento designado por alguns pesquisadores de “paralisia do sono” ou “paralisia
noturna”.
O
Espiritismo oferece grande contribuição para a compreensão do fenômeno,
porquanto o acontecimento está associado à existência e à complexidade da alma.
Muitas vezes, os que experimentam tais surtos creem-se vítimas de pesadelos ou
sonhos, porque, nesses transes, não raro veem-se fora do corpo e entram em
contato com outros Espíritos, bons ou maus, conforme suas afinidades. Certos
pesquisadores encarnados, muitos deles céticos ou alheios à questão espiritual,
interpretam tais eventos como alucinações.
Nos
casos mais agudos, denominados de letargia pelo Espiritismo, há o risco de,
acreditando-se morta a pessoa, haver o sepultamento do seu corpo sem que tenha
efetivamente morrido, o que se descobre após a exumação do cadáver.
Alguns
desses fenômenos estão descritos no Novo Testamento (Lucas, 7:11-17 [o filho da
viúva de Naim] e Mateus, 9:23-26 [a filha de Jairo]), sendo o caso mais
conhecido o da ressurreição de Lázaro, em João, 11:1-46.
O
estudo do períspirito é de fundamental importância para a compreensão deste e
de outros episódios de ordem espiritual, por ser ele o intermediário entre o
Espírito e o corpo físico, como reportado por Kardec em A Gênese, nos itens 29 e 30 do cap.
XIV (Catalepsia. Ressurreições).
A
determinação do momento da morte do indivíduo nem sempre é fácil,
particularmente na faixa etária pediátrica, envolvendo questões biológicas,
éticas, morais, legais e sócio culturais.
O
conceito de morte vem sofrendo modificações, nos últimos tempos, em decorrência
do desenvolvimento, pela Medicina, de novas técnicas de ressuscitação e suporte
avançado para o atendimento a doentes criticamente enfermos, proporcionando a
modernização do diagnóstico da morte.
Atualmente,
a morte cerebral ou a morte do encéfalo, conjunto de centros nervosos que
comanda as demais funções do organismo humano, é o critério científico de
diagnóstico do encerramento da vida, aceito pela comunidade científica, e não
mais simplesmente a interrupção da atividade cardíaca ou respiratória.
Por
isso, hoje em dia, pelo menos nas regiões mais desenvolvidas, é remota a
probabilidade de uma pessoa ser sepultada viva, sobretudo se, na realização do
diagnóstico da morte, forem seguidos os procedimentos clínicos e complementares
recomendados pelo Conselho Federal de Medicina.
A
morte é um processo complexo lento e gradual. A vida não pode ser entendida
pela simples presença de sinais vitais isolados em órgãos e tecidos, mas sim de
elementos vitais estruturados que, em conjunto, formam a concepção de pessoa.
Entretanto,
uma vez cessadas, irreversivelmente, as funções de TODO o encéfalo, incluindo o
tronco cerebral, não há qualquer possibilidade de reanimar o indivíduo, e em
pouco tempo todos os demais órgãos interromperão o funcionamento.
Se
o indivíduo estiver acometido do transe letárgico ou cataléptico, seu
despertamento poderá ser feito com a ajuda de preces e ou por meio da ação
magnética (passes), desde que o socorro seja prestado antes da degeneração
irreversível das células.
Não
é raro ouvirmos relatos, inclusive pela mídia,[iii] sobre pessoas que foram declaradas mortas e depois
“ressuscitaram” durante o velório.
Yvonne
do Amaral Pereira (1906-1984), notável médium brasileira, desde criança
apresentava esses sintomas e, graças ao uso correto de sua mediunidade, a
chamada “mediunidade com Jesus”, transformou essas faculdades em sublime fonte
de bênçãos. Em seu livro “Recordações da Mediunidade”, editado pela FEB, Yvonne
narra, com riqueza de detalhes, no cap. 2, sob o título “Faculdade nativa”, um
desses acessos que teve, quando, contando menos de um mês de idade, foi dada
como morta.
Fiando-se
nas conhecidas passagens do Novo Testamento, há aqueles que ainda acreditam que
Jesus promoveu a ressurreição, isto é, devolveu a vida a pessoas que já teriam
morrido. Contudo, analisando a passagem evangélica, em que é reportada a
suposta morte da filha de Jairo, notem o que Jesus disse: “Retirai-vos, porque não está morta a menina, mas dorme (...).” (Mateus,
9: 24).
Em
realidade, essas pessoas foram despertadas por Jesus de um transe cataléptico
ou letárgico, viveram mais um tempo e depois, como todo mundo, tiveram que
enfrentar a morte biológica. Entretanto, muitos religiosos preferem interpretar
tais fatos como milagres, satisfazendo, assim, o seu apreço pelo maravilhoso.
O
Espiritismo demonstrou que esses e outros feitos de Jesus são de ordem natural,
uma vez que resultam da ação espiritual sobre os fluidos, pelo pensamento e
pela vontade.[iv]
Intuitivo,
também, é que Deus, a suprema inteligência, não permitiria a revogação das leis
que ele próprio criou, com o objetivo de convencer homens incrédulos, céticos e
ignorantes.
No
que tange, especificamente, aos aspectos mais perturbadores da catalepsia e da
letargia, reportamo-nos aos lúcidos ensinamentos do Dr. Bezerra de Menezes:
Tais acidentes são próprios do
carreiro da evolução, e enquanto o homem não se integrar de boamente na sua
condição de ser divino, vibrando satisfatoriamente no âmbito das expansões
sublimes da Natureza, mecanicamente estará sujeito a esse e demais distúrbios.[v] Segue-se que, para a lei da Criação, a chamada morte
não só não existe como é considerada fenômeno natural, absolutamente destituído
da importância que os homens lhe atribuem, exceção feita aos casos de suicídio
e homicídio. (...)
A provocação desses fenômenos nada
mais é que a ação magnética anestesiando as forças vibratórias até ao estado
agudo, e anulando, por assim dizer, os fluidos vitais, ocasionando a chamada
morte aparente, por suspender-lhe, momentaneamente, a sensibilidade, as
correntes de comunicação com o corpo carnal, qual ocorre no fenômeno
espontâneo, se bem que o fenômeno espontâneo possa ocupar um agente oculto,
espiritual, de elevada ou inferior categoria.
Se, no entanto, o fenômeno
espontâneo se apresentar frequentemente e de forma como que obsessiva, a cura
será inteiramente moral e psíquica, com a aproximação do paciente aos
princípios nobres do Evangelho moralizador e ao cultivo da faculdade sob normas
espíritas ou magnéticas legítimas, até ao seu pleno florescimento nos campos
mediúnicos.[vi]
Quando
bem orientadas e aproveitadas, a catalepsia e a letargia, “que mais não são do que manifestações da
vida espiritual”,[vii] podem ser utilizadas como
faculdades mediúnicas de enorme potencial, de onde são extraídos grandes
ensinamentos e revelações em torno da alma, advindo daí novos conhecimentos
científicos em prol da Humanidade.
Tais
ocorrências evidenciam a existência de algo no ser humano independente da
matéria, no caso, o Espírito, o que tem compelido os cientistas a buscar um
novo paradigma para o tratamento e a solução dos problemas que afligem o ser
humano.
* Artigo publicado na Revista Reformador, FEB, novembro 2008, p. 29-31.
[i] KARDEC, Allan. O livro dos espíritos, 72ª ed. Rio
de Janeiro: FEB, 1992. 2ª parte, cap. VIII, “Da emancipação da alma”, nota à q.
424.
[ii] Revista Superinteressante nº
176, mencionada no site http://super.abril.com.br/superarquivo/2002/conteudo_120294.shtml
[iii] http://noticias.terra.com.br/popular/interna/0,,OI2268585-EI1141,00.html
[iv] Para maiores informações,
consulte o cap. XIII da quinta obra codificada por Allan Kardec, A gênese, sob o título “Os milagres
segundo o espiritismo”.
[v] Além desses fatores,
encontramos na lei de causa e
efeito a gênese de tais distúrbios, como se infere do testemunho do
Espírito Antonio B. registrado por Kardec na 2ª parte da obra básica editada
pela FEB, O céu e o inferno, no
cap. VIII, sob o título “Expiações Terrestres”, Enterrado vivo – A pena de talião.
[vi] PEREIRA, Yvonne A. Recordações da mediunidade. 7ª ed.
Rio de Janeiro: FEB, 1992. Cap. 1, “Faculdades em estudo”, p. 16 e 18.
[vii] KARDEC, Allan. A gênese. 34ª ed. Rio de Janeiro:
FEB, 1991. Cap. XIV, “Os Fluidos. II. Explicação de alguns fenômenos
considerados sobrenaturais” item 23, p. 290.
MATÉRIA
DIVULGADA PELO MÉDIUM GETULIO PACHECO QUADRADO.
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