CAPÍTULO XXVII. PEDI E OBTEREIS.
DA PRECE PELOS MORTOS E PELOS ESPÍRITOS
SOFREDORES.
Esta escrito no nosso Evangelho Segundo o Espiritismo, que os Espíritos
sofredores reclamam preces, e estas lhe são de utilidade, pois ao verem que são
lembrados, sentem-se menos abandonados e menos infelizes.E a prece tem sobre
eles uma ação mais direta: reergue-lhes a coragem, excita-lhes o desejo de se
elevarem, pelo arrependimento e a reparação, e pode desviá-los do pensamento do
mal. É nesse sentido que ela pode não somente aliviar, mas abreviar-lhes os
sofrimentos.
Esta escrito também que algumas pessoas não admitem a prece pelos
mortos, porque acreditam que a alma só tem uma alternativa: ser salva ou
condenada às penas eternas. Num e noutro caso, portanto, a prece seria inútil.
Sem discutir o valor dessa crença, admitamos por um instante a realidade das
penas eternas e irremissíveis, e que as nossas preces sejam impotentes para interrompê-las.
Perguntamos se mesmo com essa hipótese, é lógico, é caridoso, é cristão,
recusar a prece pelos réprobos? Essas preces, por mais importantes que sejam
para libertá-los, não serão para eles uma prova de piedade, que poderá
minorar-lhes os sofrimentos? Na Terra, quando um homem é condenado à prisão
perpétua, mesmo que não haja nenhuma esperança de obter-se a graça para ele, é
proibido a uma pessoa caridosa auxiliá-lo a carregar o peso dos grilhões?
Quando alguém está atacado de mal incurável, não havendo, portanto nenhuma
esperança de cura, deve-se abandoná-lo sem nenhum alívio? Pensai que entre os
réprobos pode estar uma pessoa que vos seja cara: um amigo talvez um pai, a mãe
ou um filho, e só porque, segundo julgais, essa criatura não pode ser perdoada,
poderia recusar-lhe um copo d'água para mitigar a sede, um bálsamo para
secar-lhe as feridas? Não faríeis por ela o que faríeis por um prisioneiro? Não
lhe daria uma prova de amor, uma consolação? Não, isso não seria cristão! Uma
crença que endurece o coração não pode conciliar-se com a crença num Deus que
coloca, como o primeiro de todos os deveres, o amor do próximo!
Negar a eternidade das penas não implica negar uma penalidade
temporária, mesmo porque, na sua justiça, Deus não pode confundir o mal com o
bem. Ora, nesse caso, negar a eficácia da prece seria negar a eficácia da
consolação, dos estímulos e dos bons conselhos; e isso equivaleria a negar a
força que haurimos da assistência moral dos que nos amam.
Diz também que outros se fundam numa razão mais especiosa: a imutabilidade dos
desígnios divinos. Deus, dizem, eles, não pode modificar as suas decisões a
pedido das criaturas, pois caso contrário nada seria estável no mundo. O homem
nada tem, portanto, de pedir a Deus, cabendo-lhes apenas submeter-se e adorá-lo.
Há nesta ideia uma falsa interpretação da imutabilidade da lei divina,
ou melhor, ignorância da lei, no que concerne à penalidade futura. Essa lei é
revelada pelos Espíritos do Senhor, hoje que o homem já amadureceu para
compreender o que, na lei, é conforme ou contrário aos atributos divinos.
Segundo o dogma da eternidade absoluta das penas, nem os remorsos nem o
arrependimento são considerados a favor do culpado. Para ele, todo o desejo de
melhorar-se é inútil: está condenado a permanecer eternamente no mal. Se foi
condenado, entretanto, por um determinado tempo, a pena cessará no fim do
prazo. Mas quem pode afirmar que ele terá então melhorado os seus sentimentos?
Quem dirá que, a exemplo de muitos condenados da Terra, ao sair da prisão, ele
não será tão mau quanto antes? No primeiro caso, seria manter sob a dor do
castigo um homem que se tornara bom; no segundo, seria agraciar aquele que
continua culpado. A lei de Deus é mais previdente: sempre justa equitativa e
misericordiosa, não fixa nenhuma duração para a pena, qualquer que seja. Ela se
resume assim:
“O homem sofre sempre a consequência das suas faltas; não há uma única
infração à lei de Deus, que não tenha a sua punição”.
“A severidade do castigo é proporcional à gravidade da falta”.
“A duração do castigo, para qualquer falta, é indeterminada,
pois fica subordinada ao arrependimento do culpado e ao seu retorno ao bem;
assim, a pena dura tanto quanto a obstinação no mal; seria perpétua, se a
obstinação o fosse; é de curta duração, se o arrependimento vir logo”.
“Desde que o culpado clame por misericórdia, Deus o ouve e lhe concede a
esperança. Mas o simples remorso não basta: é necessária a reparação da falta.
É por isso que o culpado se vê submetido a novas provas, nas quais ele pode,
sempre pela sua própria vontade, fazer o bem para a reparação do mal
anteriormente praticado”.
“O homem é assim o árbitro constante da sua própria sorte. Ele pode
abreviar o seu suplício ou prolongá-lo indefinidamente. Sua felicidade ou sua
desgraça depende da sua vontade de fazer o bem”.
Essa é a lei; lei imutável e conforme a bondade e à
justiça de Deus.
O Espírito culpado e infeliz, dessa maneira, pode sempre se salvar a si
mesmo: a lei de Deus lhe diz sob quais condições ele pode fazê-lo. O que
geralmente lhe falta é à vontade, a força e a coragem. Se, pelas nossas preces,
lhe inspiramos essa vontade, se o amparamos e encorajamos; se, pelos nossos
conselhos, lhe damos as luzes que lhe faltam, em vez de solicitar a
Deus que derrogue a sua lei, tornamo-nos instrumentos da execução dessa lei de
amor e caridade, da qual ele assim nos permite participar, para darmos nós
mesmos uma prova de caridade.
Bibliografia: O Evangelho Segundo o
Espiritismo. Mensagem lida e divulgada pelo Médium Getulio Pacheco Quadrado.
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