sexta-feira, 12 de fevereiro de 2021

DURAÇÃO DAS PENAS FUTURAS.

 


O LIVRO DOS ESPÍRITOS. CAPÍTULO VII. DURAÇÃO DAS PENAS FUTURAS

Quanto a duração dos sofrimentos do culpado na vida futura, se é arbitrária ou subordinada a alguma lei, a resposta é, que Deus nunca age de maneira caprichosa e tudo no Universo é regido por leis que revelam a sua sabedoria e a sua bondade.

Já com referência o que determina a duração dos sofrimentos do culpado, o certo é que o é o tempo necessário ao seu melhoramento. O estado de sofrimento e de felicidade sendo proporcional ao grau de pureza de Espírito, a duração e a natureza dos seus sofrimentos dependem do tempo que ele precisa para se melhorar. Á medida que ele progride e que os seus sentimentos se depuram, seus sofrimentos diminuem e se modificam. (São Luís.)

Para o Espírito sofredor o tempo parece tão longo ou mais curto do que quando estava encarnado, São Luís nos diz que parece mais longo: que o sono não existe para ele. Só para os Espíritos que atingiram um certo grau de purificação o tempo se apaga, por assim dizer, em face do infinito.

A duração dos sofrimentos do Espírito pode ser eterna, se ele fosse eternamente mau, ou seja, se jamais tivesse de se arrepender nem de se melhorar. Então, sofreria eternamente. Mas Deus não criou seres eternamente votados ao mal. Criou-os apenas simples e ignorantes, e todos devem progredir num tempo mais ou menos longo, de acordo com a própria vontade. Esta pode ser mais ou menos retardada, assim como há crianças mais ou menos precoces, mas, cedo ou tarde, ela se manifesta por uma irresistível necessidade que o Espírito sente em sair da sua inferioridade e ser feliz. A lei que rege a duração das penas é, portanto, eminentemente sábia e benevolente, pois subordina essa duração aos esforços do Espírito, jamais lhe tirando o livre-arbítrio; se dele fez mau uso, sofrerá as consequências disso. (São Luís.)

Não há Espíritos que jamais se arrependem, e sim Espíritos cujo arrependimento é tardio, mas pretender que jamais se melhorem seria negar a lei do progresso e dizer que a criança não pode tornar-se adulto. (São Luís.)

A duração das penas depende sempre da vontade do Espírito, não existindo as que lhe são impostas por um tempo determinado, e podem ser impostas por determinado tempo, mas Deus, que não deseja senão o bem de suas criaturas, aceita sempre o arrependimento, e o desejo de se melhorar nunca é estéril. (São Luís)

Segundo isso, as penas impostas jamais seriam eternas, mas vamos raciocinar se uma condenação perpétua, em consequência de alguns momentos de erro, não seria a negação da bondade de Deus. Que é, com efeito, a duração da vida, mesmo que fosse de cem anos, em relação à eternidade? Eternidade! Compreendemos bem essa palavra? Sofrimento, tortura sem fim e sem esperança, apenas por algumas faltas! Não repugna ao nosso próprio critério semelhante pensamento? Que os antigos tivessem visto no Senhor do Universo um Deus terrível, invejoso e vingativo, compreende-se; na sua ignorância emprestaram à divindade as paixões dos homens. Mas não é esse o Deus dos cristãos, que coloca o amor, a caridade, a misericórdia, o esquecimento das ofensas no plano das primeiras virtudes: poderia ele mesmo não ter as qualidades que exige como um dever? Não há contradição em se lhe atribuir a bondade infinita e a vingança infinita?  Vamos sempre dizer que antes de tudo ele é justo e que o homem não compreende a sua justiça. Mas a justiça não exclui a bondade e Deus não seria bom se destinasse às penas horríveis e perpétuas a maioria de suas criaturas. Poderia fazer da justiça uma obrigação para seus filhos, se não lhes desse os meios de a compreender? Aliás, não é sublime a justiça unida à bondade, que faz. a duração das penas depender dos esforços do culpado para se melhorar? Nisto se encontra a verdade do preceito: “A cada um segundo as suas obras”. (Santo Agostinho)

Empenhemos por todos os meios ao nosso alcance no combate, no aniquilamento da ideia da eternidade das penas, pensamento blasfemo da justiça e da bondade de Deus, a mais fecunda fonte da incredulidade, do materialismo e da indiferença que invadiram as massas, desde que a nossa inteligência começou a se desenvolver. O Espírito prestes a se esclarecer, ou ainda em vias de o fazer, bem logo compreendeu a monstruosa injustiça. Sua razão a repele e então raramente deixa de confundir numa mesma condenação a pena que o revolta e o Deus a que é atribuída. Disso decorrem os males sem conta que recaíram sobre nós e para os quais viemos trazer o remédio. A tarefa que nos assinalamos será tanto mais fácil quanto as autoridades em que se apoiam os defensores dessa crença evitaram de se pronunciar de modo formal. Nem os concílios, nem os Pais da Igreja decidiram de maneira absoluta essa grave questão. Se de acordo com os próprios evangelistas, tornando-se ao pé da letra as suas palavras alegóricas, o Cristo ameaçou os culpados com o fogo que não se extingue, com fogo eterno, entretanto, nada existe nessas palavras que provem tê-los condenado eternamente. Pobres ovelhas desgarradas, sabei ver que o Bom Pastor se aproxima de nós e que, longe de querer banir-nos para sempre da sua presença, vem ao nosso encontro, para nos reconduzir ao redil. Filhos pródigos, deixai o nosso exílio voluntário. Voltemos para a morada paterna: o Pai nos abre os braços e está sempre pronto para festejar o nosso retorno à família. (Lamennais)

Os Bons Espíritos nos dizem ser guerras de palavras! Guerras de palavras! E perguntam, se não temos feito verter bastante sangue? E se será ainda necessário reacender as fogueiras? Discutem-se as expressões: eternidade das penas, eternidade dos castigos. E se não sabemos então que aquilo que hoje entendemos por eternidade o que os antigos não o entendiam da mesma maneira? Que o teólogo consulte as fontes e como todos nós descobriremos que o texto hebraico não dava à palavra o mesmo sentido que os gregos, os latinos e os modernos traduziram por penas sem fim, irremissíveis(1). A eternidade dos castigos corresponde à eternidade do mal. Sim, enquanto existir o mal entre o homens, subsistirão os castigos; é em sentido relativo que se devem interpretar os textos sagrados. A eternidade das penas é, portanto, relativa e não absoluta. Dia virá em que todos os homens se revestirão pelo arrependimento da roupagem da inocência, e nesse dia não haverá mais gemidos ou ranger de dentes. Nossa razão é limitada, isso é verdade, mas, tal qual é, representa um presente de Deus e com a ajuda da razão não haverá um só homem de boa-fé que compreenda de outra maneira a eternidade dos castigos. A eternidade dos castigos! Como! Teríamos então de admitir que o mal fosse eterno. Mas só Deus é eterno e não poderia ter criado o mal eterno, pois, se assim não fosse, teríamos de destituí-lo do mais belo dos seus atributos: o soberano poder, porque deixa de ser soberanamente poderoso o que pode criar um demento destruidor de suas próprias obras. Humanidade, Humanidade! Não mergulhemos mais o nosso sombrio olhar nas profundezas da Terra, buscando os castigos. Choremos, esperemos, expiemos e refugiemos no pensamento de um Deus infinitamente bom, absolutamente poderoso e essencialmente justo. (Platão)

Gravitemos para a unidade divina, esse é o objetivo da Humanidade. Para atingi-lo, três coisas nos serão necessárias: a justiça, o amor e a ciência; três coisas lhe são opostas e contrárias: a ignorância, o ódio e a injustiça(2). Pois bem, em verdade os Bons Espíritos nos dizem que mentimos a esses princípios fundamentais ao comprometermos a ideia de Deus com o exagero de sua severidade, e duplamente ao comprometimento, deixando penetrar no Espírito da criatura o pensamento de que ela possui mais clemência, mansuetude, amor e verdadeira justiça do que costumemos atribuir ao Ser Infinito. Destruamos mesmo a ideia de inferno, tornando-a ridícula e inacessível às nossas crenças, como o é para os nossos corações o horrendo espetáculo das execuções, das fogueiras e das torturas da Idade Média. Mas como? É quando a era das represálias cegas já foi superada pelas legislações humanas que esperamos mantê-la numa forma ideal? Oh! Vamos crer, irmãos em Deus e em Jesus Cristo, crer ou resignamos a deixar perecer nas nossas mãos todos os nossos dogmas, para permitir a sua alteração, ou, então, vivifiquemos, abrindo aos benéficos eflúvios que os bons Espíritos derramam neste momento sobre nós. A ideia do inferno com suas fornalhas ardentes, com suas caldeiras ferventes, pôde ser tolerada ou admissível num século mitológico; mas no século dezenove não passa de vão fantasma que só serve para amedrontar as criancinhas, e no qual essas mesmas já não acreditam quando se tornam um pouco maiores. Persistindo nessa mitologia apavorante, acabamos de engendrar na incredulidade, origem de toda a desorganização social; eis porque tremo ao ver toda uma ordem social abalada e a ruir sobre as próprias bases por falta de sanção penal. Homens de fé ardente e viva, vanguardeiros do dia da luz, ao trabalho, pois! Não para manter velhas fábulas atualmente desacreditadas, mas para reavivar e revitalizar a verdadeira sanção penal sob formas que correspondam aos nossos costumes, aos nossos sentimentos e às luzes da nossa época.

Quem é, com efeito, o culpado? É aquele que por um extravio, por um falso impulso da alma se distancia do objetivo da Criação, que consiste no culto harmonioso do belo e do bem idealizado pelo arquétipo humano, pelo homem-deus, por Jesus Cristo.

Qual é o castigo? A consequência natural decorrente desse falso impulso; uma quantidade de dores necessárias para fazê-lo aborrecer-se da sua deformação, pela prova do sofrimento. O castigo é o aguilhão que excita a alma pela amargura a voltar-se sobre si mesma, a retornar ao caminho da salvação. O objetivo do castigo não é outro senão a reabilitação, a redenção. Querer que o castigo seja eterno, por uma falta que não é eterna, é negar-lhe toda a razão de ser.

Oh! em verdade os bons espíritos nos dizem: cessai, cessai de pôr em paralelo, na eternidade, o Bem, a essência do Criador, com o mal, essência da criatura: isso seria criar uma penalidade injustificável. Afirmemos então, ao contrário, o abrandamento gradual dos castigos e das penas pelas transmigrações e consagrareis, pela razão ligada ao sentimento, a unidade divina. (Paulo, o apóstolo)

Comentário de Kardec: Deseja-se incitar o homem ao bem e desviá-lo do mal pelo engodo das recompensas e o temor dos castigos, mas se esses castigos são apresentados de maneira que a razão repele, não terão sobre ele nenhuma influência. Longe disso, ele rejeitará tudo: a forma e o fundo. Que se lhe apresente, pelo contrário, o futuro de uma forma lógica e ele não o recusará. O Espiritismo lhe dá essa explicação.

A doutrina da eternidade das penas, no seu sentido absoluto, faz do ser supremo um Deus implacável. Seria lógico dizer-se que um soberano é muito bom muito benevolente, muito indulgente, que não deseja senão a felicidade dos que o rodeiam, mas que ao mesmo tempo é invejoso, vingativo, de um rigor inflexível e que pune com o suplício máximo três quartas partes de seus súditos por uma ofensa ou uma infração às suas leis, ainda mesmo aqueles que faliram por não as conhecer? Não seria isso uma contradição? Pois bem. Deus pode ser menos do que o seria um homem?

Outra contradição se apresenta neste caso. Desde que Deus tudo sabe, sabia então, ao criar uma alma, que ela teria de falir; ela estava desde a formação destinada à infelicidade eterna: isto é possível, é racional? Com a doutrina das penas relativas, tudo se justifica. Deus sabia, sem dúvida, que ela teria de falir, mas lhe dá os meios de se esclarecer por sua própria experiência e pelas suas próprias faltas. É necessário que ela expie os seus erros para melhor se firmar no bem, mas a porta da esperança jamais lhe será fechada e Deus faz depender o momento da sua libertação dos esforços que ela fizer para o atingir. Eis o que todos podem compreender, o que a lógica mais meticulosa pode admitir. Se as penas futuras tivessem sido apresentadas dessa maneira, haveria muito menos céticos.

A palavra eterna é quase sempre empregada na linguagem comum em sentido figurado, para designar uma coisa de longa duração e da qual não se prevê o termo, embora se saiba muito bem que esse termo existe. Dizemos, por exemplo, os gelos eternos das altas montanhas, dos polos, embora saibamos, de um lado, que o mundo físico pode ter um fim, e de outra parte, que o estado dessas regiões pode modificar-se pelo deslocamento normal do eixo da Terra ou por um cataclismo. A palavra eterno, neste caso, não quer dizer duração infinita. Quando sofremos uma longa doença, dizemos que o nosso mal é eterno. Que há, pois, para admirar, se os Espíritos que sofrem desde muitos anos, desde séculos, e até mesmo de milhares de anos, também digam assim? Não nos esqueçamos, sobretudo, de que a sua inferioridade não lhes permitindo ver o termo da rota, eles creem sofrer para sempre, o que é para eles uma punição.

De resto, a doutrina do fogo material, das fornalhas e das torturas emprestadas ao Tártaro do paganismo, está hoje completamente abandonada pela alta Teologia. Apenas nas escolas esses apavorantes quadros alegóricos são ainda apresentados como verdades positivas por alguns homens mais zelosos do que esclarecidos. E isso muito erroneamente, pois as imaginações jovens, uma vez passado o terror, poderão aumentar o número dos incrédulos. A Teologia reconhece hoje que a palavra fogo é empregada em sentido figurado, devendo ser entendida como fogo moral. (Ver item 974.) Os que, como nós, acompanharam as peripécias da vida e dos sofrimentos do além-túmulo através das comunicações espíritas puderam convencer-se de que, por não terem nada de material, elas não são menos pungentes(1). A respeito mesmo da sua duração, alguns teólogos começam a admiti-las no sentido restritivo que indicamos acima e pensam que, de fato, a palavra eterno pode referir-se às penas em si mesmas, como consequência de uma lei imutável e não na sua aplicação a cada indivíduo. No dia em que a religião admitir essa interpretação, bem como outras que são igualmente a consequência do progresso das luzes, reconduzirá ao seu seio muitas ovelhas desgarradas(2).


1) Teólogos católicos e protestantes confirmam hoje essa previsão. Leia-se Giovanni Papini: “O Diabo”, ou Haraldur Nielson: “O Espiritismo e a Igreja”. Veja-se nota anterior sobre Teilhard de Chardin. (N. do T.)

(2) Este trecho da comunicação de Paulo lembra as tríades druídicas sobre as quais há interessante estudo de Kardec na “Revue Spirite”, publicado em separata no folheto “Espiritismo: antiguidade, evolução e propagação”, do Clube dos Jornalistas Espíritas de S. Paulo. Veja-se ainda o livro de Léon Denis: “Lê Génie Celtiqiie et lê Monde Invisible”, edição Jean Meyer, Paris, 1927. (N. do T.)

(1) Ver, na Revista Espírita, as Palestras Familiares de Além-túmulo. (N. do T.)

(2) As modificações teológicas em curso na atualidade confirmam estas previsões. Vejam-se os resultados do Concílio Vaticano II e a revolução provocada na Igreja pela obra de Teilhard de Chardin. (N. do T.)

MENSAGEM DIVULGADA PELO MÉDIUM GETULIO PACHECO QUADRADO.

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