O LIVRO DOS ESPÍRITOS. PARTE SEGUNDA MUNDO ESPÍRITA
OU DOS ESPÍRITOS. CAPÍTULO II. ENCARNAÇÃO DOS ESPÍRITOS. MATERIALISMO.
O porquê os anatomistas,
os fisiologistas e, em geral, os que se aprofundam nas Ciências Naturais são freqüentemente
levados ao materialismo, é que
o fisiologista refere tudo ao que vê. Orgulho dos seres
humanos, que tudo creem saber, não admitindo que alguma coisa possa
ultrapassar o seu entendimento. Sua própria ciência os torna presunçosos.
Pensam que a Natureza nada lhes pode ocultar.
Não é verdade que o
materialismo seja uma consequência de estudos que deveriam, ao contrário,
mostrar ao ser humano a superioridade da inteligência que governa o mundo. E o ser humano que deles tira uma
falsa consequência, pois ele pode abusar de tudo, mesmo das melhores coisas. O
nada, aliás, os apavora mais do que eles se permitem aparentar, e os
espíritos fortes são quase sempre mais fanfarrões do que valentes. A maior
parte deles são materialistas porque não dispõem de nada para preencher o
vazio. Diante desse abismo que se abre ante eles, mostrai-lhes uma tábua
de salvação, e a ela se agarrarão ansiosamente.
Comentário
de Kardec: Por uma aberração da inteligência, há pessoas que não veem
nos seres orgânicos nada mais que a ação da matéria, e a esta atribuem todos os
nossos atos. Não vêem no corpo humano senão a máquina elétrica; não estudaram o
mecanismo da vida senão no funcionamento dos órgãos; viram-na extinguir-se
muitas vezes pela ruptura de um fio, e nada mais perceberam além desse fio;
procuraram descobrir o que restava, e como não encontraram mais do que a
matéria inerte, não viram a alma escapar-se e nem puderam pegá-la, concluíram
que tudo estava nas propriedades da matéria, e que. portanto, após a morte, o
pensamento se reduz ao nada. Triste consequência, se assim fosse, porque então
o bem e o mal não teriam sentido; o ser humano estaria certo ao não pensar
senão em si mesmo e ao colocar acima de tudo a satisfação dos prazeres
materiais; os laços sociais estariam rompidos e os mais santos afetos
destruídos para sempre. Felizmente, essas ideias estão longe de ser
generalizadas; pode-se mesmo dizer que estão muito circunscritas, não
constituindo mais do que opiniões individuais, porque em parte algumas foram
erigidas em doutrina. Uma sociedade fundada sobre essa base traria em si mesma
os germes da dissolução, e os membros se despedaçariam entre si, como animais
ferozes.
O ser humano tem instintivamente a
convicção de que tudo não se acaba para ele com a vida; tem horror ao nada; é
em vão que se obstina contra a ideia da vida futura, e quando chega o momento
supremo, são poucos os que não perguntam o que deles vai ser, porque a ideia de
deixar a vida para sempre tem qualquer coisa de pungente. Quem poderia, com
efeito, encarar com indiferença uma separação absoluta e eterna de tudo o que
ama? Quem poderia ver, sem terror, abrir-se à sua frente o imenso abismo do
nada, pronto a tragar para sempre todas as nossas faculdades, todas as nossas
esperanças, e ao mesmo tempo dizer: — Qual! Depois de mim, nada, nada, nada
mais que o nada; tudo se apagará da memória dos que sobreviverem a mim; dentro
em breve nenhum traço haverá de minha passagem pela terra; o bem mesmo que eu
fiz será esquecido pelos ingratos a quem servi; e nada para compensar tudo
isso, nenhuma perspectiva, a não ser a do meu corpo devorado pelos vermes!
Este quadro não tem qualquer coisa de
horroroso e de glacial? A religião nos ensina que não pode ser assim, e a razão
o confirma. Mas uma existência futura, vaga e indefinida, nada tem que
satisfaça o nosso amor do positivo. E é isso que, para muitos, engendra a
dúvida. Está certo que tenhamos uma alma; mas o que é a nossa alma? Tem ela uma
forma, alguma aparência? É um ser limitado ou indefinido? Dizem alguns que é um
sopro de Deus; outros, que é uma centelha; outros, uma parte do Grande
Todo, o princípio da vida e da inteligência. Mas o que é que tudo isso nos
oferece? Que nos importa ter uma alma, se depois da morte ela se confunde com a
imensidade, como as gotas d’água no oceano? A perda da nossa individualidade
não é para nós o mesmo que o nada? Diz-se ainda que ela é imaterial. Mas uma
coisa imaterial não pode ter proporções definidas, e para nós equivale ao nada.
A religião nos ensina também que seremos felizes ou desgraçados, segundo o bem
ou o mal que tenhamos feito. Mas qual é esse bem que nos espera no seio de
Deus? E uma beatitude uma contemplação eterna, sem outra ocupação que a de
cantar louvores ao Criador? As chamas do inferno são uma realidade ou apenas um
símbolo? A própria Igreja as compreende nesse último sentido; mas. então, que
sofrimentos são esses? Onde se encontra o lugar de suplício? Em uma palavra, o
que se faz e o que se vê nesse mundo que nos espera a todos?
Ninguém costuma-se dizer, voltou de
lá para nos dar conta do que existe. Isto, porém é um erro e a missão do
Espiritismo é precisamente a de nos esclarecer sobre esse futuro a de nos
fazer, até certo ponto, vê-lo e tocá-lo, não mais pelo raciocínio, mas através
dos fatos. Graças às comunicações espíritas, isto não e mais uma presunção uma
probabilidade sobre a qual cada um pinta à vontade, que os poetas embelezam com
suas ficções ou enfeitam de imagens alegóricas que nos seduzem. E a realidade
que nos mostra a sua face, porque são os próprios seres de além-túmulo que nos
vêm contar a sua situação, dizer-nos o que fazem, permitir-nos assistir, por
assim dizer a todas as peripécias da sua nova vida, e, por esse meio, nos
mostram a sorte inevitável que nos está reservada, segundo os nossos méritos ou
os nossos delitos Há nisso alguma coisa de anti-religioso? Bem pelo contrário,
pois os incrédulos aí encontram a fé e os tíbios, uma renovação do fervor e da
confiança. O Espiritismo é o mais poderoso auxiliar da religião. E se assim
acontece é porque Deus o permite, e o permite para reanimar as nossas
esperanças vacilantes e nos conduzir ao caminho do bem, pelas perspectivas do
futuro.
BIBLIOGRAFIA: O LIVRO
DOS ESPÍRITOS.
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