0 LIVRO DOS ESPÍRITOS. CAPÍTULO III.
PERTURBAÇÃO ESPÍRITA.
Deixando o
corpo, a alma se tem imediata consciência
não é o termo: ela fica perturbada por algum tempo. Chamo isto de
friozinho na barriga.
Nem todos
os Espíritos experimentam, no mesmo grau e pelo mesmo tempo, a perturbação que
se segue à separação da alma e do corpo. Pois isso depende da sua elevação.
Aquele que já está depurado se reconhece quase imediatamente, porque se
desprendeu da matéria durante a vida corpórea, enquanto o homem carnal, cuja
consciência não é pura, conserva por muito tempo mais a impressão da
matéria.
O
conhecimento do Espiritismo exerce alguma influência sobre a duração maior ou
menor da perturbação.
Pois o Espírito compreende antecipadamente a sua situação; mas a prática
do bem e a pureza de consciência são o que exerce maior influência.
Comentário
de Kardec: No momento da morte, tudo, a princípio, é confuso; a alma necessita de
algum tempo para se reconhecer; sente-se como atordoada, no mesmo estado de um
homem que saísse de um sono profundo e procurasse compreender a sua situação. A
lucidez das ideias e a memória do passado lhe voltam à medida que se extingue a
influência da matéria de que se desprendeu, e que se dissipa essa espécie de
nevoeiro que lhe turva os pensamentos.
A duração da perturbação de após
morte é muito variável: pode ser de algumas horas, como de muitos meses e mesmo
de muitos anos. Aqueles em que é menos longa são os que se identificaram
durante a vida com o seu estado futuro, porque então compreendem imediatamente
a sua posição.
Essa perturbação apresenta
circunstâncias particulares, segundo o caráter dos indivíduos e sobretudo de
acordo com o gênero de morte. Nas mortes violentas, por suicídio suplício,
acidente, apoplexia, ferimentos etc. o Espírito é surpreendido, espanta-se, não
acredita que esteja morto e sustenta teimosamente que não morreu. Não obstante,
vê o seu corpo, sabe que é dele, mas não compreende que esteja separado Procura
as pessoas de sua afeição, dirige-se a elas e não entende por que não o ouvem.
Esta ilusão mantém-se até o completo desprendimento do espírito, e somente
então ele reconhece o seu estado e compreende que não faz mais parte do mundo
dos vivos.
Esse fenômeno é facilmente
explicável. Surpreendido pela morte imprevista, o Espírito fica aturdido com a
mudança brusca que nele se opera. Para ele, a morte é ainda sinônimo de
destruição, de aniquilamento; ora, como continua a pensar, como ainda vê e
escuta, não se considera morto. E o que aumenta a sua ilusão é o fato de se ver
num corpo semelhante ao que deixou na terra, cuja natureza etérea ainda não
teve tempo de verificar. Ele o julga sólido e compacto como o primeiro e,
quando se chama a sua atenção para esse ponto, admira-se de não poder
apalpá-lo.
Assemelha-se este fenômeno ao dos
sonâmbulos inexperientes que não creem estar dormindo. Para eles, o sono é
sinônimo de suspensão das faculdades; ora, como pensam livremente e podem ver,
não acham que estejam dormindo. Alguns Espíritos apresentam esta
particularidade, embora a morte não os tenha colhido inopinadamente; mas ela é
sempre mais generalizada entre os que, apesar de doentes, não pensavam em
morrer. Vê-se então o espetáculo singular de um Espírito que assiste aos
próprios funerais como os de um estranho, deles falando como de uma coisa que
não lhe dissesse respeito, até o momento de compreender a verdade.
A perturbação que se segue à morte
nada tem de penosa para o homem de bem; é calma e em tudo semelhante à que
acompanha um despertar tranquilo. Para aquele cuja consciência não está pura, é
cheia de ansiedades e angústias.
Nos casos de morte coletiva,
observou-se que todos os que pereceram ao mesmo tempo nem sempre se reveem
imediatamente. Na perturbação que se segue à morte, cada um vai para o seu lado
ou só se preocupa com aqueles que lhe interessam.
Bibliografia:
O Livro dos Espíritos.
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